domingo, 20 de fevereiro de 2011


“Ele está chegando!”

A ansiedade era imensa. Desde criança imaginava esse encontro, embora soubesse, em seu íntimo, que a possibilidade de ele se realizar seria mínima. Mas, enfim, por alguma razão do destino, ela iria vê-lo.

O encontro com o ídolo seria ao meio dia. Meio dia? Sim, meio-dia. Ela iria busca-lo no aeroporto. “-Cheguei ao cúmulo! Essas fãs que ficam esperando e gritando pelo cantor preferido no aeroporto são ridículas”. E no final das contas, ria de si mesma. “-Cá estou eu, ridicularizando a mim mesma.”

Não se importava. Iria ver a pessoa que cantava seus sentimentos desde a infância. E, mesmo imaginando todas as palavras que poderia falar ao ídolo, mesmo ensaiando o que diria se tivesse a possibilidade de encontra-lo, não sabia o que falar. Era apenas mais uma fã enlouquecida pela chance de vê-lo de perto.

Ele chegava. “-engordou alguns quilos, mas ainda é bonito!”, foi o que ela pensou à primeira vista. Decidiu não gritar como os outros fãs faziam. “-Sei que ele não gosta de fãs assim, ele é quieto!”. Ficou encolhida, esperando os repórteres saírem de perto. “-talvez eu tenha a chance de falar-lhe algo!”

Os jornalistas fizeram sua pequena entrevista, e ela esperava. Quando o ídolo ia sentar para, finalmente, almoçar, decidiu. Decidiu não, foi empurrada! Por sorte, o fotógrafo oficial do jornal era seu amigo. “-Vá lá, realize seu sonho!”, foi o que ela ouviu. E, na sorte, e digamos que até na malandragem, foi atrás.

“-Posso tirar uma foto com você?”, disse ela, timidamente. “-Claro!”, respondeu o cantor, puxando a fã para dar os dois beijinhos no rosto de cumprimento. Ao sentir pousar a mão dele em seu ombro, ela pensou que desmaiaria. “Por favor, não vomite agora!”.

Foto tirada. Ela acrescentou: “-faça um bom show, amanhã!”. O ídolo respondeu: “Sim, obrigado Espero por você lá!”

No final das contas, ela sabia que ele não iria mais lembrar as feições dela. Mas ela recordaria aquele momento como um dos mais especiais de sua vida. Conquistar os menores sonhos, aqueles que poderiam até ser considerados bobos, é apenas o primeiro degrau que nos dá apoio para conquistar os maiores.

“Esse foi apenas o primeiro!”, pensou ela, fortalecida.


**texto feito sobre o meu encontro com Andre Matos

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

da minha mãe

Estava tranquila, era um dia tranquilo. Já tinha lido mais da metade de "O Vendedor de Armas", livro de um dos meus atores preferidos, Hugh Laurie. Todos sabem que eu tenho uma queda especial por ele. Mas, como todos, sei que ele vai morrer como o Dr.House. Não sei se isso é bom ou se é ruim, mas enfim.

Voltando ao contexto, eu estava tranquila e era um dia tranquilo. Quando vejo minha mãe, uma bela senhora de 56 anos (sim, bela, muito mais bela do que eu jamais fora, jamais serei.), aos prantos. "Deve de ser o cansaço, ter uma filha bipolar, um filho obeso, uma mãe caducando, dez anos sem um marido ao lado", foi o que pensei. E na verdade, até poderia estar certa. Minha mãe é uma pessoa que tem todos os problemas do mundo e com certeza que, ao morrer, vai apertar no botãozinho "céu" no elevador das passagens.

Seria normal ela pensar tudo isso, mas, neste dia especial, mamãe chorava por outra coisa. "Anne, eu e Maria (nome fictício) brigamos". Quem é Maria? Maria é a melhor amiga de minha mãe, são amigas há 30 anos, trabalham no mesmo lugar, já viajaram juntas ao Rio de Janeiro, onde ela, inclusive, se hospedou no apartamento de minha avó.

As duas conservavam uma amizade sem nunca terem sequer discutido. E ver minha mãe chorando... bom, veja bem, minha mãe não é uma pessoa que costuma demonstrar sentimentos. Sim, do tipo que nunca diz "eu te amo" a não ser que você esteja embaixo de uma roda de caminhão. Morrendo. Não, não, não é certo que ela diga. Talvez ela diga. Ela é fria, chegando à ignorância. Ver minha mãe chorando daquela forma me mostrou o quão adolescente os adultos são.

Depois de conversar, convencer que é assim mesmo, servir de mãe à minha mãe, pensei muito e cheguei a uma conclusão: podemos até crescer, mas nunca, nunca deixaremos de ser adolescentes.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Da carta ao pai

Ainda recordo o dia fatídico em que o senhor disse que iria embora. Foi um adeus simples, daqueles que a gente engole pra não chorar, ou que nem tem vontade de chorar, ou que simplesmente não importa. Escrevo-lhe pra contar como anda minha vida hoje.

Bom, deixei de gostar de livro infanto-juvenis. Meus autores preferidos hoje são Kafka e a Emile Bronte. Sim, meu gosto tornou-se um pouco mais refinado, talvez porque tenha crescido.

Tenho uma cicatriz grande no cotovelo, o senhor nao a conhece. Foi quando cai numa das apresentações que o senhor nunca viu.

Minhas pernas têm marcas da época da depressão. Não uso saias porque tenho vergonha. Mas mamãe, muito bondosa, já comprou-me um bom remédio que dizem que é muito bom. Tem de ser, pelo preço.

Cortei meu cabelo. Lembra-se que toda vez que o cortava o senhor sentia raiva de mim, dizendo que os cabelos são o véu da mulher? Pronto, livrei-me desse véu inexistente e cortei-lhes. Como há mais de dois anos o senhor não me vê, não sabe a altura que eles se encontram, portanto resolvi contar.

O último filme que assisti foi Viagem a Darjeeling. Achei engraçado. Lembrou-me da vez que todos viajamos à praia, e o senhor tirou aquela foto de sunga verde-limão. Não que o filme se passe em uma praia, se passa na Índia, mas lembrou-me de alguma forma.

Larguei a faculdade que o senhor queria que eu fizesse e hoje escolhi o meu destino. Eu sei que não foi de seu total agrado, mas estou me virando bem. Encontro-me feliz na profissão que escolhi. Eu sei, qualquer um pode seguir tal carreira, mas preferi fazer faculdade antes para segui-la de forma próspera.

Então, faz onze anos que não dormimos sob o mesmo teto, não durmo mais em seu quarto, relaxe. Vovó resolveu passar mal e veio morar conosco. Ela não o suportaria, assim como não me suporta, então você está melhor que eu.

Notícia minhas.

Até mais

*Inspirado em "Carta ao Pai", do kafka

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

a menina de treze

Bem naquela fase incômoda, entre os 12 e 14 anos, em que o termo criança é quase abominável. E ela não podia ser diferente. Nessa época, o interessante é ser diferente, e como todos pensam da mesma forma, acabam por se tornarem todos iguais.

A garota não era diferente. Claro, como a mãe bailarina que quebrara os pés numa apresentação, ela era apaixonada por ballet. Opa, uma diferença. Mas, ao contrário de sua geração comum, não se interessava pelas músicas que faziam sucesso. Quer dizer, suas músicas e artistas preferidos faziam sucesso, mas não para o mesmo público. Ok, mais uma diferença.

Acredite ou não, mas aos treze, dava conselhos à amigas de vinte e dois. Sim, tinha amigas de vinte e dois. Que recebiam seus sermões de cabeça baixa, e não acreditando em como uma garota tão jovem poderia ser tão madura. Ou não tanto assim. Olha aí outra diferença!

Esqueçam tudo o que eu disse: ela era diferente.

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

da menina que escrevia

Ela escrevia, o tempo todo. Parecia não acabar assunto, mesmo quando não se tinha nada a dizer. Sempre tinha algo a dizer.

Sua infância não fora fácil. Não, nunca lhe havia faltado nada, pelo menos não economicamente. Mas, com exceção de um ou dois amigos, sua vida não era de todo completa. Até conhecer os livros, seus eternos companheiros.

Era uma Matilda da vida real. Lia muito, escrevia muito, e em muitas línguas. Aos treze já tinha feito seu primeiro livro, aos quinze já era reconhecida internacionalmente. Aos dezoito, bom, aos dezoito estava apenas começando a faculdade.

Seus cabelos lisos pareciam seda. Marcavam-lhe o rosto redondo e chamavam atenção à sua boca em formato de coração. Aos outros, era uma garota comum. Mas sabia, em seu íntimo, que não o era.

E vivia assim. Escondida em seu próprio corpo. E para conhecê-la melhor, para vê-la de perto... Bom, nunca poderia conhecê-la por completo.

*essa garota existe e é a minha melhor amiga, desde os 16.


quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

da arte de mudar

Encarregaram-me de algo difícil. Não, difícil não é a palavra correta. Vamos recomeçar a sentença: ENCARREGARAM-ME DE FAZER ALGO IMPOSSÍVEL. Hm... Ok.

Certo dia, num desses livros de frases espirituosas (e não me pergunte qual) li que a fé ri das impossibilidades. Brindo, meus senhores, à minha arte de ser maçantemente possível. Sou a pessoa mais medrosa que existe na face da Terra. Sim, sim, eu supero os outros 7 bilhões e meio de "terráqueos" (o número de habitantes da terra já é maior que isso?).

Esse é meu jeito
atual. Medo, insegurança. Se eu tivesse que mudar meu nome, com certeza seria Anne Christine Medrosa Insegura Moura do Nascimento. Olha só, seria grande, quase um nome de princesa.

Depois de mais uma noite turbulenta, dessas que fazem a gente pensar, e beber água, e pensar mais uma vez, e abrir a geladeira, e pensar pensar e pensar ; decidi que abominarei, excluirei, assassinarei as palavras Medo e Insegurança do meu
dicionariozinho medíocre. Chega! Simplesmente chega de pensar que não consigo.

Pra quem viveu a vida inteira pensando que fé, força de vontade e toda aquela coisa clichê toda não existe... bom, está certo. Mas dessa vez, só pra testar, apenas DESTA VEZ, eu rirei das impossibilidades.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Sobre a mulher de cabelos compridos

Devia ter noventa centímetros de cabelo, no mínimo. Eram grandes cabelos lisos, loiros, que lhe desciam a cintura e quase chegavam às nádegas. Mais lembrava a mais bela seda já vista, quão brilhoso era.

A moça de cabelos compridos dedicou-se durante toda a vida à dança. Por mais que tentasse fugir para outras áreas, sua maior dedicação sempre lhe seguia, como se tivesse vida própria. Não adianta fugir daquilo que se nasceu pra fazer.

Seus progenitores pensavam que ela iria abandonar toda essa história quando, enfim, encontrasse alguém que lhe desposasse. Engano. Mesmo casada, continuou a dançar. Tiveram ainda a esperança quando ela quebrou os dois pés enquanto fazia uma belíssima apresentação, de casa cheia, inclusive. Nem o médico tirou sua esperança de, enfim, um dia, voltar a dançar.

Esse dia veio antes do imaginado. Dois meses depois, já estava nos palcos, fazendo o que nasceu pra fazer.

Não adianta fugir, nunca adianta fugir. E seus cabelos continuam grande, são um ser que vivem dela e com ela. E, como ela, eles também dançam, lindamente.


*A mulher existe e é minha professora de ballet.