terça-feira, 25 de outubro de 2011

do cigarro


-Você me trocou por um analfabeto.

Ele se sentia um lixo. Ora, era letrado, o que ela tinha que fazer com alguém que julgava-se mal saber escrever, ler, conversar? O que ela via naquele ser que mais parecia um homem das cavernas, com sua barba por fazer? Não era visível que ele não queria mais que uma noite com ela?

Sentou-se do lado de fora da casa e fumou um cigarro. Desejava uma taça de vinho, ler alguma coisa que o fizesse entender. Pensar em algo inteligente para acabar com aquela história toda. Mostrar que ela estava errada.

Veio-lhe à mente, na metade do cigarro, o que ele fizera nos últimos dez anos. Fora um casamento de idas e vindas. Ela sempre fora muito ciumenta, gostava de demonstrar seu amor e de sentir amor. Ele era um desses homens que não demonstravam. Não precisamos demonstrar amor, basta que o vivamos, era o que dizia sempre quando ela estava aos prantos, rogando por um momento de atenção. Ela só queria que ele dissesse que a amava.

Em parte estava certo. Ela nunca vivia esse amor, sempre dizia que sentia falta. Nos primeiros quatro anos, ele reclamava. Depois de uma separação, ele sentiu a falta. Ela era uma artista na cama. E ele, ele era um homem comum, com desejos, vontades, instintos. Pediu para reatar. Ela aceitou, meio indiferente.

A indiferença dela no início fora uma dádiva. Oh, graças a Deus ela não me liga tanto, ela está mais confiante em si mesma. Ah, ela tem outras atividades. Nossa, ela está trabalhando? Quem diria. Academia? Pra ficar mais bonita pra mim, só pode!

Até que um dia, o excesso de atividades dela começou a incomodá-lo. Por que você faz tantas coisas? E a resposta? Ora, eu aprendi a viver sem você.

Passada a raiva, ele lembrou-se de todas as vezes que a fez chorar, que desligou o telefone na cara dela, que a chamou de palavrões, quantas alianças eles tiveram que refazer porque ele ou as perdia, ou jogava-as fora? Imagine, aquele caso que teve com a melhor amiga dela. Como ela sofreu.

-Fui um calhorda! Eu mereço tudo isso

E foi assim, calmamente, que ele percebeu que seu cigarro já havia apagado.

2 comentários:

  1. Me lembrou um personagem meu. Um que sentia falta de um café que sempre achou amargo demais, ao perceber que era ele que adoçava suas manhãs. Algumas pessoas precisam perder pra dar valor, né?
    Gostei. :*

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  2. E aqui estamos, os mosqueteiros, os personagens e as verdades.

    Já não me admiro como algumas pessoas são, ou na verdade, o mundo tem se tornado... A vida, os sentimentos, coisas que poderiam ser intensas a todos se tornando banais, comuns, descartáveis...

    E claro, doloridas às vezes para nós que lutamos em não se render à essa loucura.

    Não sei se estamos no rumo certo, mas a felicidade em mim é principalmente por ver que algumas coisas ainda tem jeito...

    Um grande abraço a vocês duas. []

    E nada de espalhar por aí que ando dizendo essas coisas. kkkk Sou mau! ;)

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